quarta-feira, 6 de novembro de 2024

À minha segunda mãe

    Não sei sequer como começar a falar sobre isso, porque meus sentimentos ainda afloram, mesmo após quatro anos, quando lembro de ti ou penso em ti, tudo virou um tabú que eu tento, inutilmente, vencer. É mais fácil falar dez palavrões em sequência do que o seu nome, até mesmo a sua função de tia, eu não consigo dirigir a ninguém, me sinto o Wonka tentando falar a palavra "pai", virou uma palavra sagrada para mim, uma memória de alguém tão incrível, uma verdadeira super-heroína, que acompanhou todos os familiares nos hospitais até seus leitos de morte, mas morreu sozinha, abandonada, num quarto onde ninguém podia ir até ti.

    Consigo imaginar o sofrimento, a solidão e a dor que você passou, a enfermeira contou que você dizia: "Não me deixe fechar os olhos, estou com medo de não acordar mais", e você, no hospital que tanto odiava por ter levado de ti tantos parentes importantes, repousava ali, somente como um número no hospital Otávio de Freitas, somente mais uma. Esta uma que foi dita como "doença psicológica", por um médico na UPA, agora estava pagando o preço de uma conta que não era dela.

    Nunca mais pude te ter ao meu lado, pois agora não estávamos no mesmo mundo, lembro de promessas que te fiz e não pude cumprir, lembro-me, em Março de 2020, no seu aniversário, poucos dias depois, na verdade, eu tinha feito um bolo de coco, lembro que você disse que queria muito comer bolo prestígio, mas eu já tinha planejado o de coco, tolo eu de achar que este plano valia de algo, te disse, inocentemente: "Ano que vem, no seu aniversário, prometo que faço um bolo prestígio para você, só esperar, não precisa se preocupar", eu pensava que era cedo, mas, no momento que tomei aquela decisão, já era tarde.

    Te prometi também que terias teu espaço em minha futura casa, quando a construísse, que colocaria uma rede entre dois pés de manga, sua fruta preferida, hei de fazer, sempre que quiser, pode visitar, se é que existe uma forma, será seu porto seguro. Teu lugar em minha morada, assim como em meu coração, sempre será teu. Todas as promessas que te fiz, pode me cobrar, buscarei fazê-las de bom grado, igualmente ao seu amor por mim, o meu por ti é incondicional. 

    Esquecer de você é como negar quem tanto fez por mim, mas lembrar de ti também é sofrido, como um martírio, é um dilema que tenho, lembro-me que não fiz, enquanto em sua vida, tudo que deveria ter feito, por alguém tão importante, tão especial, que cuidou de todos nós. Lembro que naquele dia, chorei muito, mas não deixei ninguém ver meu pranto, lembro de passar dias chorando em meu canto, tantas semanas que não sei nem contar. Enquanto alguém lembrar de ti, você estará viva, seu sorriso, sua história, sua capacidade de ver a maldade das pessoas sem sequer conhecê-las, sempre acertando. Sua morte em 06 de Novembro de 2020 não me deixou com medo de viver, mas sim de não ter vivido o bastante quando for tarde de mais.


Toinho Stark do Cangaço, 04-06/11/2024

(Não tenho medo de viver, mas sim de não ter vivido o bastante quando for tarde de mais)

(Lembro de minhas promessas e de tudo que não pude cumprir, de ter te dito, inocentemente, que sempre teria o próximo ano para cumprir, eu pensava que era cedo, mas ali já era tarde demais no momento que tomei aquela decisão)

(Não consigo nunca te esquecer)

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